O momento pandêmico reverbera em toda sociedade, causando transformações em diferentes dimensões da vida cotidiana. A educação não passa incólume. Os impactos são sentidos desde o anúncio de ruptura do isolamento social, criando nas famílias trabalhadoras uma apreensão a respeito do destino de seus filhos, repercutindo nas escolas a pressão que se faz para que o comércio abra. Assim, temos de um lado a tentativa de avanço da ideologia neoliberal sobre o campo educacional; de outro, a resistência de trabalhadores e trabalhadoras e estudantes para que a educação não seja precarizada.

No que diz respeito às relações de trabalho, o avanço da política neoliberal tardia e a flexibilização de direitos trabalhistas repercutem negativamente na vida dos trabalhadores e das trabalhadoras na educação, atingindo educadores e educadoras, que têm de assumir rotinas de trabalho cada vez mais intensas e passar a conviver mais intimamente com o fantasma do desemprego e da redução salarial com redução de jornada na rede não-pública, particularmente no segmento da educação infantil e básica, por um lado, e enfrentar ameaças históricas como o congelamento, o parcelamento e, agora, a redução salarial, conforme se tem visto na rede pública, por outro. Professores e professoras, e funcionários e funcionárias das duas redes, pública e não-pública, portanto, têm sentido os reflexos da pandemia (embora de formas diferenciadas) tanto no que diz respeito à insegurança quanto na amplificação do trabalho docente desenvolvido de forma remota.

Esta amplificação do trabalho toma formas distintas, mas uma tem se apresentado particularmente arriscada para a qualidade da educação: a utilização do ensino remoto como panaceia durante o período de pandemia. Entendemos que em alguns casos, principalmente nas instituições não públicas, possa ser uma necessidade nesse momento. No entanto, nos preocupa a perspectiva futura de utilização desse mecanismo como “normalidade” pós-pandemia. Tratada por diferentes nomes, esta forma de organizar a relação educativa tende a exigir de professores, professoras, funcionários e funcionárias, atributos para os quais, a princípio, não lhes foi oferecido nenhum tipo de formação ou capacitação, particularmente para as redes e ensino pública ou nas redes de ensino não-público onde a educação a distância não é, nem nunca foi, seu modelo histórico de aprendizagem.

O ensino remoto acaba por ser uma transposição de técnicas da educação presencial para modalidades à distância, e nesse movimento a educação é desfigurada, perdendo sua qualidade tanto pela carência de ofertas de formação/capacitação para os professores, professoras, funcionários e funcionárias, como pela ausência, particularmente para a educação básica pública, de uma rede que sustente as atividades virtuais. Assim, quem arca com os custos dessa tentativa de ensino remoto são os próprios professores, professoras, funcionários e funcionárias que, não bastasse terem seus salários congelados, ainda têm de investir em equipamentos eletrônicos e contas de internet para poderem realizar seu trabalho. Resulta disso a proposta de um arremedo de Educação à Distância por parte dos governos para a educação básica, evidenciando ainda mais a dualidade estrutural da escola não-pública e da escola pública, daquele que pode pagar uma escola virtualmente de qualidade e aquele que é refém da escola pública precarizada.

Na mesma medida e consequência, uma enorme parcela dos e das estudantes fica excluída do acesso ao ensino remoto por falta de recursos para terem equipamentos e um provedor de internet. Essa transposição, além de ampliar sobremaneira o trabalho docente, também cerceia o direito à educação de grande parte de alunos e alunas, tratando igualmente os desiguais e, por consequência, ampliando ainda mais as desigualdades e oportunidades entre as classes sociais historicamente constituídas e fonte das mais variadas injustiças e violências contra nossos direitos e dignidade humana.

Portanto, diante das iniciativas que têm por fim desqualificar a educação e pretendem abrir caminho para uma versão meramente mercantilizada de ensino, transformando professores, professoras, funcionários e funcionárias em sujeitos precarizados e estudantes em clientes que acessam um serviço qualquer, como muito se banalizou ao longo da educação no Brasil, é necessário defender a qualidade da educação, o que aponta para uma luta maior, por uma sociedade voltada para a formação de cidadãos e cidadãs e não meros consumidores. Lutar pela educação é lutar também pelos educadores e pelas educadoras.

Não se legitima portanto, nenhuma forma de redução salarial para os trabalhadores e trabalhadoras já hoje vilipendiados, seja em que categoria for. Nem tampouco que se utilize de medidas espúrias como a simples demissão e aplicação de medidas provisórias de que se valem o estado, o município ou os empregadores que se beneficiam de leis que protegem seus negócios e se desresponsabilizam com a proteção social e a dignidade de seus trabalhadores e trabalhadoras.

Do mesmo modo, que se tenha como incontestável! Se a condição dos professores, professoras, funcionários e funcionárias é uma entre tantas outras, que se crie políticas públicas mínimas, que venham de fato garantir a sobrevivência dos trabalhadores e das trabalhadoras, não essa que hoje se aglomera nos postos da Caixa Federal abarrotados por um auxílio miserável que para muitos não virá.

  • Que se afirme para todos, público e não-público, indistintamente, que a educação não mercadoria, mas ciência, conhecimento e afirmação da dignidade humana.
  • Que o trabalho, contra o ultra neoliberalismo explícito das políticas governamentais, seja a necessidade de uma outra sociedade e de um novo modelo econômico.
  • Que a educação não seja um arremedo, mas sim a base de construção de uma sociedade mais justa e menos desigual.
  • Que a pandemia nos evidencie que a crise é social, econômica, política, humana, e nos ensine que outro mundo só se constituirá se formos atentos de que precisamos de uma nova educação.
  • Que a crise seja paga pelo grande capital que historicamente acumulou suas riquezas com o trabalho da sociedade e sob proteção do Estado.
  • Que seja regulamentado (como já previsto na Constituição) a criação de imposto sobre grandes fortunas, bem como sejam criados outros mecanismos que tornem menos injusto o atual modelo tributário (novas alíquotas do IR; fim da isenção sobre ganhos de capital; aumento da taxação de herança a partir de certos patamares, etc).

Assinam este manifesto:

SIMP

ADUCPEL

ADUFPEL

ASUFPEL

CPERS

SINASEFE

SINPRO/RS

SINTAE/RS