Nós, trabalhadores na área de saúde mental da Prefeitura Municipal de Pelotas, vimos através deste manifesto, dizer da nossa indignação pela forma como estamos sendo tratados pelo Sr. Prefeito, quando impõe uma condição de diferença e de menor crédito às diferentes profissões que compõe este campo de trabalho em saúde, em relação à área médica.

Cumpre-nos informar ao Sr. Prefeito e a população em geral, que a área de saúde mental atua através de equipes interdisciplinares, visto a complexidade do fenômeno com o qual trabalhamos, ou seja, o sofrimento psíquico em suas mais variadas expressões e manifestações, onde apenas uma área de saber, não dá conta do cuidado. Os profissionais envolvidos e previstos em legislações para atuar em saúde mental de forma integrada, sem hierarquias ou sobreposições são: psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais, psiquiatras, médicos clínicos, profissionais de artes, músicos, artesãos, merendeiras, profissionais de educação física, recepcionistas, agentes administrativos, entre outros. Sendo que em uma equipe interdisciplinar de saúde mental, todos atuam de forma conjunta, com saberes igualmente necessários, para a melhor resposta de atenção psicossocial. A saúde mental está prevista em legislação específica, Lei 10.216/2001 e em diferentes portarias para seu pleno desenvolvimento. A portaria 336 prevê o funcionamento dos serviços em duas equipes, distribuídas em um turno de trabalho por equipe.

Muito nos surpreende, portanto, o entendimento do Sr. Prefeito de que não merecem o mesmo tratamento, profissionais contratados pelos mesmos editais, com a mesma carga horária, com o mesmo nível de qualificação técnica e iguais condições de trabalho. Sendo ainda alegado motivação de legalidade para a imposição de alteração de carga horária, que historicamente foi estabelecida por administrações municipais há mais de vinte anos. Observamos assim uma grave ilegalidade no tratamento diferenciado em relação a carga horária de trabalhadores regidos pelo mesmo regime, com concurso do mesmo edital e mesmo contrato.

A indignação do conjunto dos trabalhadores da área da saúde mental é ainda maior pelas colocações do Sr. Prefeito na mídia escrita e falada, em que anuncia que com a implantação do ponto biométrico e o aumento da carga horária estaria moralizando o serviço público, fazendo com que os funcionários municipais trabalhem. Pois bem, é importante dizer ao Sr. Prefeito que os trabalhadores deste município é que fazem funcionar a máquina pública. Somos nós, trabalhadores, que no cotidiano da nossa ação ensinamos, atendemos, cuidamos, enfim, ofertamos os diferentes serviços, pelos quais a população nos paga através dos impostos. É o que fazemos, nestas últimas gestões, com muitas adversidades. O sucateamento de nossas instalações, a falta de recursos materiais e humanos é evidente e percebida inclusive pela população que reclama e se solidariza com nossas condições de trabalho.

A atual gestão não apresenta planejamento, não dá condições para que atuemos em plena capacidade e de forma simplista apresenta a penalização do servidor municipal como causa das dificuldades e precariedades nas mais diversas áreas de atuação, incluindo a saúde.

Informamos ao Sr. Prefeito que a área de saúde mental construiu literalmente, com a atuação comprometida, engajada e qualificada de seus funcionários a rede que hoje temos. Nós, trabalhadores de saúde mental, escrevemos projetos, procuramos espaços para implantar os serviços, planejamos ações,  descrevemos os cargos necessários para nossa ação e aprovação na Câmara municipal, buscamos o cadastramento no SUS e hoje enfrentamos sua atual precariedade com coragem e determinação. Enfim, nós construímos os serviços de CAPS, portanto mais do que ninguém estamos comprometidos com este trabalho. E saiba, Sr. Prefeito, que fizemos tudo isso com 20 horas de trabalho semanal e outras tantas à noite e aos fins de semana, por desejo próprio e não por imposição de qualquer gestor. Assim, há alguns anos conseguimos um prêmio nacional, como uma das melhores redes de saúde mental do país, entregue durante a III Conferência Nacional de Saúde Mental em 2001.

Por interesse, comprometimento e desejo buscamos a qualificação do nosso trabalho através de especializações, mestrados e doutorados, sem contar em sua gestão com qualquer incentivo, nem mesmo o cumprimento do que está escrito no estatuto do servidor  municipal, e que, portanto é legal, dispensa de horas de trabalho para fazê-lo e mesmo assim o fazemos, para oferecer à população maior qualidade no cuidado.

Atualmente, Sr. Prefeito, trabalhamos com equipes defasadas, não contamos mais com médicos em todos os CAPS, menos ainda psiquiatras (conforme a portaria 336), não contamos com o profissional merendeiro e não oferecemos alimentação aos nossos usuários, conforme prevê a portaria. Não contamos com profissionais de educação física em todos os serviços, entre outros. Estamos, portanto, na ilegalidade, e esta causada pela gestão municipal.

Para finalizar, informamos que sua gestão rompe com a isonomia entre os trabalhadores, conquistada e prevista em legislação. Rompe com o espírito de equipe e de valorização entre os trabalhadores da saúde, que hoje se sentem submetidos a processos de trabalho com tratamento diferenciado e injusto. Enfim, pensamos que tenta romper com nossa determinação e com nosso compromisso, mas esse manifesto, assim como outras ações que certamente encaminharemos, demonstra que essa crise que ora vivemos, poderá ser a motivação para enfrentarmos o atual momento e fortificarmos a luta pela Saúde Mental, seguindo os princípios da Reforma Psiquiátrica em nosso país (previsto em lei).